Como funcionava a Justiça na São Paulo colonial | Ernst Pijning

Adelto Gonçalves, jornalista, cronista e historiador, escreveu o seu terceiro livro de História. Romancista e contista, o seu interesse maior está na literatura, mas os seus dois primeiros livros na área de História foram sobre dois poetas setecentistas: Tomás Antônio Gonzaga (1744-1810) e Manuel Maria de Barbosa du Bocage (1765-1805). Mas, mesmo nestes dois livros biográficos –Gonzaga, um Poeta do Iluminismo (Rio de Janeiro, Editora Nova Fronteira, 1999) e Bocage, o Perfil Perdido (Lisboa, Editorial Caminho, 2003) –, Adelto é um cronista: ele adora os detalhes, as localidades, as vidas pessoais, os sucessos literários, as amizades e as brigas.

            Além disso, os dois poetas também foram influenciados pelo sistema jurídico: o pai de Bocage foi juiz de fora em Beja, em Portugal, e ficou encarcerado durante sete anos, nas garras do intendente Pina Manique (1733-1805); e Gonzaga, o inconfidente ouvidor de Vila Rica, ainda voltou a ser funcionário régio durante o seu no exílio na Ilha de Moçambique.

            Adelto nestes dois livros mostra como se pode fazer História sem obrigar o leitor a enfrentar um texto enfadonho. As duas obras são um tesouro de detalhes para os historiadores e apresentam muitas informações novas sobre os dois poetas. Já em seu novo livro, Direito e Justiça em Terras d´El-Rei na São Paulo Colonial: 1709-1822 (São Paulo, Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2015), ele estuda um tema bem presente nos outros dois: o Direito setecentista, mas, desta vez, na capitania de São Paulo.

            O autor considera este livro um trabalho complementar aos de Stuart B. Schwartz e de Arno e Maria José Wehling sobre o Tribunal Superior da Bahia e o Tribunal da Relação do Rio de Janeiro, respectivamente. Mas este livro de Adelto é um pouco diferente: é menos um estudo institucional e de suas práticas e mais uma análise da atuação dos funcionários e do comportamento das pessoas.

            Também não se inicia com o ano da criação da capitania (1709), mas sim com a colonização de São Vicente no século 16, com o donatário perto da sua cidade natal, Santos. A exemplo de seus dois livros anteriores, este é igualmente inclusivo e amplo. Inclui Rio de Janeiro e Salvador, quando administravam o território de São Paulo, o que abrange todo o período colonial.

            O retrato que Adelto Gonçalves traçou mostra o desenvolvimento de cargos relacionados com o dinheiro. No período inicial, o Direito ficava nas mãos de uma variada classe de funcionários: juízes ordinários, vereadores, meirinhos, provedores e corregedores, que não tiveram uma educação formal na Universidade de Coimbra, em Portugal. Julgavam e decidiam com base nos usos e costumes. Era difícil pagar o salário de um funcionário, se não houvesse uma base financeira. Por isso, o governo em Portugal até hesitou em nomear novos representantes de seu poder em tempos duros.

            Por exemplo, a cidade de São Paulo, durante a Guerra da Sucessão Espanhola, nem contou com ouvidor nem governador. Afinal, faltava representação a Portugal. Importante era que os outros funcionários, da Câmara, da Provedoria, da Alfândega, os juízes ordinários, eram todos oriundos de famílias locais e faziam movimentar a Justiça e os negócios do Estado. Quase todos tinham comprado os seus ofícios, que ficavam entre membros de sua própria família durante várias gerações.

            Depois da separação das capitanias de São Paulo e Minas Gerais, a situação mudou para um regime de reinóis. Os dois principais cargos de Justiça eram os de ouvidor e o de governador e capitão-general (cargos concomitantes). Os ouvidores administravam a Justiça na comarca, os juízes de fora na cidade ou nas vilas, enquanto o governador e capitão-general era a cabeça da capitania.

            Para melhor entender como isso funcionava, Adelto descreve a atuação de cada ouvidor e governador setecentista (mesmo se não tomavam posse!) e explica como eles, na maioria das vezes, desentendiam-se. Até porque não estavam bem definidas as áreas de atuação de cada um. E um sempre podia invadir a seara do outro, o que causava descontentamentos e atritos.

            Nesse sentido, Direito e Justiça em Terras d´El Rei na São Paulo Colonial fica bem perto do livro sobre Gonzaga, que como ouvidor na Vila Rica, brigava bastante com o governador, o que também ocorreu em Moçambique.

            Ou seja, a administração colonial não seguia um compêndio de regras fixas, mas dependia do humor e da decisão de personalidades. Utilizando a correspondência do Conselho Ultramarino e do secretário do Ultramar, o autor explica cada controvérsia, especialmente entre estes dois altos funcionários e oferece boas explicações sobre os acontecimentos na capitania. Fiquei, por exemplo, bem surpreso e contente com os detalhes acerca do roubo do quinto de Mato Grosso (o ouro foi trocado por chumbo). Aqui, Adelto se mostra um minucioso pesquisador.

            Com a chegada da Corte em 1808, mudaram-se também os poderes nas capitanias, inclusive na de São Paulo. Entrou aqui no jogo político uma importante família local, a de José Bonifácio de Andrada e Silva (1763-1838). No caso da capitania de São Paulo, as elites locais passaram a ter um contato direto com o centro do poder, que ficava no Rio de Janeiro. Assim, mudou-se a balança de um governo de reinóis para um governo essencialmente paulista.

            O autor nunca quis dar a palavra final sobre a justiça colonial, mas, com certeza, deu início a um debate. Afinal, os historiadores vão encontrar neste livro informações importantes, especialmente sobre ouvidores, juízes de fora, juízes ordinários, vereadores, corregedores e provedores e a própria Justiça à época. Como está para ser publicado também o livro Magistrados a serviço do Rei: a administração da Justiça e os Ouvidores-Gerais na Comarca do Rio de Janeiro (1710-1790), de Isabela de Mello, temos de agradecer a estes dois autores por terem dado à Justiça o lugar que merece na História do Brasil.

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Direito e Justiça em Terras d’El-Rei na São Paulo Colonial, 1709-1822, de Adelto Gonçalves (São Paulo: Imprensa Oficial do Governo do Estado de São Paulo, 364 págs., 2015, R$ 55,00). ISBN: 978-85-401-0138-8. Site: www.imprensaoficial.com.br

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(*) Ernst Pijning é doutor (PhD) em História pela Universidade Johns Hopkins, de Baltimore, Maryland, Estados Unidos,  e mestre em História pela Universidade de Leiden, Holanda. É professor desde 1999 da Minot State University, de Dakota do Norte, Estados Unidos. Especialista em História da América Latina, seus interesses de pesquisa abrangem o Atlântico-Sul, incluindo Brasil e África, e o comércio intercultural no século XVIII.

A religião como fato cultural | Adelto Gonçalves

                                                       I

             Algumas teorias políticas, como as do comunismo e do anarquismo, atraíram multidões não só porque pregavam a igualdade entre os homens como prometiam aos descrentes em mudanças graduais a revolução dos costumes e o fim dos privilégios e das classes sociais, ou seja, o paraíso na Terra. O anarquismo esgotou-se logo porque defendia que não existia ditadura do proletariado, mas apenas ditadura de um partido ou de meia-dúzia de espertalhões. Mas o comunismo durou décadas e levou muitos jovens idealistas que não acreditavam mais nas religiões a sacrificar a própria vida em favor de um futuro que não existiria.

            Apesar do fracasso dessas teorias, volta e meia, ainda existem demagogos que se aproveitam da chamada democracia burguesa para empolgar as massas com promessas mirabolantes. Como mostra a experiência, essas aventuras invariavelmente acabam em desastres, pois, quando chegam ao poder, os demagogos precisam não só cuidar dos negócios particulares e dos de sua família como favorecer apaniguados, pois o que mais desejam é se locupletar com os recursos públicos ou com as mamatas que os negócios feitos à sombra frondosa do Estado sempre propiciam.

            Tudo isso resulta em decepção para as massas, que continuam famélicas e errantes, ao menos nos países do Terceiro Mundo. Diante dessa situação de caos, as religiões ressurgem periodicamente porque, de certa maneira, respondem às ameaças que são feitas cotidianamente, colocando em risco a sobrevivência da humanidade. E trazem solidariedade às vítimas, o que nunca se viu nos regimes que defendiam que a vida dos homens se esgotava no âmbito da animalidade.

            É o que mostra o professor e sacerdote Silvio Firmo do Nascimento em O homem diante do Sagrado: Alguns elementos da antropologia das religiões (Londrina: Humanidades, 2008), livro que não discute uma religião específica, mas que trata da religião como obra humana edificada em torno do sublime, como diz o filósofo José Maurício de Carvalho, que foi professor do Departamento de Filosofia da Universidade Federal de São João del-Rei (UFSJ) e, atualmente, do Instituto de Ensino Superior Presidente Tancredo de Almeida Neves (Iptan), no percuciente prefácio que escreveu para este trabalho. Segundo Maurício de Carvalho, neste livro, a religião é examinada como fato cultural, &l dquo;produto da nossa ação transformadora do mundo, ainda que esse fato não invalide o reconhecimento da inspiração divina” (NASCIMENTO, 2008, p. 9).

                                                           II

De fato, num tempo como o de hoje em que a precariedade humana é tão presente no dia-a-dia da população, depois do fracasso das experiências totalitárias, as religiões, sejam as tradicionais ou as chamadas pentecostais, ainda cumprem o seu papel fundamental, que é o de infundir esperança e alimentar os sonhos de amor e paz, ou seja, manter o homem vivo, para se repetir aqui uma expressão do poeta e dramaturgo alemão Bertold Brecht (1898-1956).

Depois de discutir a conceituação de antropologia, de religião e de antropologia da religião, Firmo do Nascimento avalia as teorias psicológicas e sociológicas que falam da origem da religião, analisando as hipóteses do sociólogo francês Émile Durkheim (1858-1917), do neurologista austríaco Sigmund Freud (1856-1939), criador da Psicanálise, e do filósofo inglês Herbert Spencer (1820-1903), sem deixar de penetrar na obra do poeta e filósofo latino Tito Lucrécio Caro (Ca.99aC-143).

“Estarrecidos pelos males provocados na humanidade em nome da religião – guerras, divisões, imposições, sacrifícios humanos, explorações, conquistas, matanças –, alguns pensadores antigos e modernos desconfiaram da seriedade da religião e quiseram ver a sua origem na maldade do coração ou na perversão da mente”, diz o professor, adicionando entre os pensadores modernos adeptos dessas teorias o filósofo britânico Bertrand Russel (1872-1970) e o escritor e dramaturgo argelino Albert Camus (1913-1960).

Em suas considerações finais, Firmo do Nascimento (2008, p. 124) defende não podemos ficar restritos à expressão “só Jesus salva”, mas acreditar e agir como seres verdadeiramente humanos comprometidos com a verdade através do homem bom: zeloso, sigiloso, honesto e objetivo. “A fé precisa descer das altas esferas transcendentes para ocupar-se com o homem como habitação divina. Noutras palavras: não se pode separar a experiência religiosa das outras experiências humanas”, diz (idem), acrescentando que “a religião possui essência libertadora e deve questionar o imperialismo cultural europeu e norte-americano” (idem).

Enfim, o leitor que adentrar este livro, com certeza, sairá dele diferente, mais fortalecido espiritualmente, pois, como diz o autor, em suas derradeiras palavras, o homem precisa da harmonia consigo mesmo, com os outros, com a natureza e com Deus, para viver humanamente o sentido da vida. Ou seja: “a experiência da solidão leva-nos à solidariedade, da fraternidade à comunhão, da finitude ao infinito e da consciência do limite dos bens naturais à revalorização da natureza” (NASCIMENTO, 2008, p. 128).

                               III

            Sílvio Firmo do Nascimento (1956), sacerdote diocesano em São João del-Rei, Minas Gerais, é doutor em Filosofia pela Universidade Gama Filho, do Rio de Janeiro (2001), mestre em Filosofia pela Universidade Federal de Juiz de Fora, Minas Gerais (1992), bacharel em Teologia pela Pontifícia Universidade Católica (PUC), do Rio de Janeiro (1987), e fez Licenciatura Plena em Estudos Sociais e Filosofia pela Fundação Educacional de Brusque, Santa Catarina, hoje Faculdade Dehoniana (1983).

            É autor dos livros Teses morais do tradicionalismo do século XIX (Londrina: Edições Humanidades, 2004), A religião no Brasil após o Vaticano II: uma concepção democrática da religião (Barbacena: Unipac, 2005), A Igreja em Minas Gerais na República Velha (Curitiba: Juruá, 2008), A pessoa humana segundo Erich Fromm (Curitiba: Juruá, 2010), A centralidade da eucaristia na vida da humanidade (Garap uava: Pão e Vinho, 2011), Gotas de sabedoria (Curitiba: Instituto Memória, 2012), A educação em um mundo globalizado, em coautoria com o professor Kennedy Alemar da Silva (Belo Horizonte: O Lutador, 2014) Pressupostos epistemológicos e antropológicos da ética do tradicionalismo (Curitiba: CRV, 2ª ed., 2016), além de artigos sobre filosofia, ética, educação e religião.

            Atuou como docente na Universidade Presidente Antônio Carlos (Unipac), de Barbacena, Minas Gerais, de 1992 até 2008. Atualmente, é membro do Comitê de Ética em Pesquisa da Unipac, membro efetivo da Academia de Letras de São João del-Rei e docente do Iptan, de São João del-Rei. Atua como editor da Revista Saberes Interdisciplinares, periódico semestral multidisciplinar do Iptan. Tem experiência na área de Educação, com ênfase em Filosofia da Educação, atuando principalmente com os seguintes temas: liberdade- propriedade-educação, tradicionalismo, educação, catolicismo e ética.

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O homem diante do Sagrado: Alguns elementos da antropologia das religiões, de Silvio Firmo do Nascimento, com prefácio de José Maurício de Carvalho. Londrina: Edições Humanidades, 126 págs., R$ 40,00, 2008. E-mail: silviofirmodonascimento@gmail.com Site:www.iptan.edu.br

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 (*) Adelto Gonçalves é doutor em Literatura Portuguesa pela Universidade de São Paulo (USP) e autor de Os vira-latas da madrugada (Rio de Janeiro, José Olympio Editora, 1981; Taubaté, Letra Selvagem, 2015), Gonzaga, um poeta do Iluminismo (Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1999), Barcelona brasileira (Lisboa, Nova Arrancada, 1999; São Paulo, Publisher Brasil, 2002), Bocage – o perfil perdido (Lisboa, Caminho, 2003), Tomás Antônio Gonzaga (Academia Brasileira de Letras/Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2012), e Direito e Justiça em Terras d´El-Rei na São Paulo Colonial (Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2015), entre outros. E-mail: marilizadelto@uol.com.br

o homem

Bárbara Bulhosa em entrevista ao DN

O nome da entrevistada e o da editora Tinta da China confundem-se. Praticamente são uma única imagem na cabeça do clube de fãs leitores que adoram todos os livros, bem como a revista Granta, que Bárbara Bulhosa publica. Uma editora independente que consegue manter-se à tona entre o pouco espaço comercial que os grandes grupos deixaram no mercado livreiro em Portugal atualmente, que trouxe à luz do dia um punhado de bons autores e ótimos livros.

Leia a entrevista dada a Orlando Almeida do DN.

Bárbara Bulhosa. Foto Global Imagens para o DN.

Berlim – traços gerais de uma viagem

Eduardo Pitta esteve em Berlim e partilha essa experiência no seu blogue. “Cinco dias em Berlim permitiram desfazer o enigma desta cidade inscrita a ferro e fogo na memória cultural e política da minha geração. Não basta conhecer os últimos cem anos de História, ter seguido a passo a literatura, o cinema e amemorabilia gay. Relatos avulsos de um punhado de amigos ajudam, mas é preciso ver e compreender. Tentarei alinhavar alguns tópicos.”

 

Retirado de Da Literatura.

Torre de televisão da antiga RDA. Fonte: Da Literatura.

Rodolfo Alonso, o fabricante de encantos | Adelto Gonçalves

     I

           Depois de conhecer Antologia Pessoal, do poeta argentino Rodolfo Alonso, edição bilingue, com traduções de José Augusto Seabra (1937-2004), Anderson Braga Horta e José Jeronymo Rivera (Brasília, Thesaurus Editora, 2003), o leitor brasileiro tem a oportunidade de entrar em contato com Poemas Pendentes, do mesmo autor, igualmente em edição bilingue, com tradução de Anderson Braga Horta e apresentação de Lêdo Ivo (1924-2012), que acaba de chegar ao mercado pela Editora Penalux, de Guaratinguetá-SP.

            Um dos maiores poetas latino-americanos do nosso tempo, Rodolfo Alonso tem tudo para ser o primeiro argentino a ganhar o Prêmio Nobel de Literatura, mas, a exemplo de Jorge Luis Borges (1899-1986), Julio Cortázar (1914-1984) e Ernesto Sabato (1911-2011), corre o risco de ser igualmente esquecido pela Academia Sueca, que, na América Latina, premiou Gabriela Mistral (1945), Miguel Ángel Astúrias (1967), Pablo Neruda (1971), Gabriel García Márquez (1982), Octavio Paz (1990) e Mario Vargas Llosa (2010).

                                                           II

            Na contracapa, há um texto de Carlos Drummond de Andrade (1902-1987) em que o poeta diz que Alonso não usa as palavras pela sensualidade que desprendem, mas pelo silêncio que concentram. Mais: que “sua poesia tenta exprimir o máximo de valores no mínimo de matéria vocabular, impondo-se por uma concisão que chega à mudez”.

            Quer dizer, depois de uma apresentação como essa, não há muito para um resenhista o que acrescentar. Mas ainda vale a pena reproduzir o que Lêdo Ivo no prefácio disse dele, a quem chamou, com incontestável precisão, de “fabricante de encantos”: nesta coletânea, os poemas se exibem sempre em sua nitidez e concretude, com a rigorosa face imagística.

            Lêdo Ivo, outro grande poeta esquecido pela Academia Sueca, aponta para o pano de fundo que cerca a poesia de Rodolfo Alonso, dizendo que sempre aponta para “uma era de emergências e turbilhões do século XX, como seu extenso catálogo de colisões e mudanças”. É o que se pode ver neste trecho do poema mais extenso desta coletânea, “Ocupem-se de Arlt”, de 1977, em que ele homenageia o romancista Roberto Arlt (1900-1942), que, em tão pouco tempo de vida, criou obras fundamentais, como Los siete locos (1929), um romance sobre a impotência do homem diante da sociedade que o oprime e obriga a trair seus ideais e a aceitar a hipocrisia burguesa. Eis um trecho:

                        Recordo a primeira vez que vi atuar a Aliança

                        os primeiros noticiosos do pós-guerra

                        rostos de homens mulheres meninos judeus quase sempre

                                   em ossos atrás de arame farpado

                        os campos de concentração que nunca esquecerei

                        como o inextinguível esplendor leproso do cogumelo de

                                   Hiroxima

                        a primeira vez que foram me buscar no colégio um dia de chuva

                                   como um casaco para lançar-me aos ombros não tinha capa

                        Recordo o barulho da chuva sobre o teto de um automóvel dentro

                                   do qual sou um menino que sobe pela primeira vez num carro

                        quando havia poucos carros

                        e descobre ambas as coisas

                        a intimidade de um interior em movimento  a intimidade da chuva

                                   a cara íntima que a cidade dá à chuva no outono o prazer de

                                   escutar chover sobre um teto

                        Recordo a impossibilidade da prosa para contar tudo isso

                        Recordo estas duas linhas de Rafael Alberto Arrieta

                        (“Sol da manhã/ glória do inverno”)

                        lidas num de meus primeiros livros de leitura

                        nas quais sem dúvida descobri a poesia

                        por experiência própria

                        e de uma vez para sempre

                        Quisera vir a ler outra vez Os sete loucos (…)

            Para o leitor brasileiro – pouco conhecedor da história argentina –, o tradutor Anderson Braga Horta lembra que a Aliança aqui citada é uma referência ao violento grupo de extrema direita Alianza Libertadora Nacionalista, muito ativo à época do primeiro período do governo de Juan Domingo Perón (1895-1974), que vai de 1946 a 1955. Acrescente-se aqui que Rafael Alberto Arrieta (1889-1968) foi um professor e poeta que chegou a ocupar a presidência da Academia Argentina de Letras (1964), ligado ao modernismo do nicaraguense Rubén Darío (1867-1916), que nada tem a ver com o modernismo brasileiro, mas com a tendência francesa art nouveau.

            Composto em parte por poemas mais antigos que não apareceram em livros anteriores e em parte por poemas recentes, alguns curtos, de duas linhas, mas não hai kais, este livro traz ainda uma homenagem – a que poucos poetas brasileiros fizeram – à cantora brasileira Maria Bethânia, de 2007, em que se lê:

                                   (…) Há tom, há densidade,

                                   há gravidade, há timbre,

                                   há palavra que canta

                                   e há música que expressa

                                   a pulsação que sentes.

                                   Rege, Bethânia, ordena

                                    a poesia do mundo,

                                   torna o caos em sentido,

                                   a altura em canto fundo,

                                   e faz do intenso, alento (…)

                                                           III

            Poeta, tradutor e ensaísta reconhecido internacionalmente, Rodolfo Alonso (1934) foi pioneiro na tradução para o castelhano na América Latina dos poemas de Fernando Pessoa (1888-1935), especialmente de seus heterônimos, e de grandes poetas brasileiros, dos quais era amigo como Carlos Drummond de Andrade, Murilo Mendes (1901-1975), Manuel Bandeira (1886-1968) e Lêdo Ivo.

            Publicou mais de 30 livros. Traduziu poemas do francês, italiano e galego. Foi editado não só na Argentina como no Brasil, Bélgica, Colômbia, Espanha, inclusive em galego, México, Venezuela, França, Itália. Cuba, Chile e Inglaterra. Destacam-se as suas celebradas traduções de grandes poetas como Giuseppe Ungaretti (1888-1970), Cesare Pavese (1908-1950), Paul Eluard (1895-1952), Eugenio Montale (1896-1981), Charles Baudelaire (1821-1867) e Guillaume Apollinaire (1880-1918), entre outros.

            Entre as distinções que recebeu, estão o Prêmio Nacional de Poesia e o Prêmio Único Municipal de Ensaio Inédito (por La voz sin amo), da Argentina, a Ordem Alejo Zuloaga da Universidade de Carabobo, na Venezuela, e Palmas Acadêmicas, da Academia Brasileira de Letras. Seu último livro de poemas, El arte de callar, obteve o Prêmio Festival Internacional de Poesia de Medellín, na Colômbia.

            Seu arquivo pessoal (textos e fotos) encontra-se em fase de catalogação na Universidade de Princeton, nos Estados Unidos. Recentemente, foi lançada em inglês The art of keeling quiet (Salt, Cambridge, 2015). Na França, saíram no mesmo ano L´art de se taire, com prólogo de Juan José Saer (Paris, Reflet de Lettres), e Dernier tango à Rosario (Paris, Al Amar) e está para ser lançado Entre les dents, com prólogo de Juan Gelman (Toulouse, Po&psy/Erès). Na Espanha, saiu em idioma galego Cheiro de choiva (Cangas, Barbantes, Cangas, 2015) e está prevista a publicação de Tango do galego fillo (Cangas, Rinoceronte). Dirigiu sua própria editora, com um catálogo de mais de 250 livros.

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Poemas Pendentes, edição bilingue, de Rodolfo Alonso. Tradução e notas de Anderson Braga Horta, com apresentação de Lêdo Ivo. Guaratinguetá-SP: Editora Penalux, 2016, 198 págs. E-mail: penalux@editorapenalux.com.br

Site: www.editorapenalux.com.br

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(*) Adelto Gonçalves, mestre em Língua Espanhola e Literaturas Espanhola e Hispano-americana e doutor em Literatura Portuguesa pela Universidade de São Paulo (USP), é autor de Os vira-latas da madrugada (Rio de Janeiro, José Olympio Editora, 1981; Taubaté, Letra Selvagem, 2015), Gonzaga, um poeta do Iluminismo (Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1999), Barcelona brasileira (Lisboa, Nova Arrancada, 1999; São Paulo, Publisher Brasil, 2002), Bocage – o perfil perdido (Lisboa, Caminho, 2003), Tomás Antônio Gonzaga(Academia Brasileira de Letras/Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2012), e Direito e Justiça em Terras d´El-Rei na São Paulo Colonial (Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2015), entre outros. E-mail: marilizadelto@uol .com.br

Salinas, o poeta do amor | Adelto Gonçalves

     I

           Depois de lançar em 2012 a tradução de A Voz a Ti Devida (Brasília; Thesaurus Editora), de Pedro Salinas (1891-1951), o tradutor José Jeronymo Rivera (1933) coloca no mercado Razão de Amor & Longo Lamento, do mesmo autor, pela Editora Kelps, de Goiânia, contribuindo para que o poeta espanhol seja um pouco mais conhecido no Brasil. Trata-se de dois livros em um só volume, que compõem com A Voz a Ti Devida uma trilogia daquele que é conhecido no mundo hispânico como “o poeta do amor”.

            Salinas fez parte da Geração de 27, que inclui, entre outros, Rafael Alberti (1902-1999), Jorge Guillén (1893-1984), Luis Cernuda (1902-1963), Vicente Aleixandre (1898-1984) e Federico García Lorca (1898-1936), o mais famoso deles. É verdade que A Voz a Ti Devida é o seu título mais conhecido, justamente considerado o melhor livro de poesia amorosa do século XX da Literatura Espanhola, mas os que compõem a trilogia não ficam nada a dever.

            Esta trilogia faz parte da segunda etapa da vida de Salinas como poeta, que é marcada por uma lírica em segunda pessoa, dirigida à mulher amiga e amada, mas evocada no ambiente da época, a conturbada década de 30 na Espanha, que fez Salinas mudar-se compulsoriamente para os Estados Unidos, onde a partir de 1936 passou a atuar como professor universitário. Esses poemas, especialmente os dois últimos livros da trilogia, seriam inspirados pela professora norte-americana Katherine Whitmore, com quem o poeta viveu um romance naquele país.

            Na poesia dessa fase, são comuns metáforas de muita intensidade, dentro de longas estrofes que se valem de elementos métricos curtos, com assonâncias, que estabelecem um ritmo inconfundível. Desse período são La Voz a ti Debida (1933); Razón de Amor (1936) e Largo Lamento (1939).

                                                           II

            De assinalar é que a primeira fase da poesia de Salinas vai até o começo da década de 30, influenciada por Juan Ramón Jiménez (1881-1958), período em que publicou Presagios (1924), Seguro azar (1929) e Fabula y signo (1931). A terceira etapa vai de 1939 até a sua morte, em 1951, período em que publicou mais dois livros – El contemplado (1946) e Todo más claro y otros poemas (1949).  Em 1955, em edição póstuma, saiu Confianza, que reúne poemas do período de 1942 a 1944.

            Graduado em Direito, Letras e Filosofia, Salinas dedicou-se sempre à docência universitária. De 1914 a 1917, atuou como leitor de Espanhol na Sorbonne, em Paris, onde se doutorou em Letras. De sua afinidade com a cultura francesa resultou a vontade de traduzir para o espanhol Em busca do tempo perdido, de Marcel Proust (1871-1922), tarefa que não chegou a concluir, tendo vertido alguns volumes.

            Depois, Salinas ensinou na Universidade de Sevilha e, em 1922-23, em Cambridge.  Passou para a Universidade de Múrcia e, em seguida, para a de Madri. As circunstâncias da guerra civil espanhola (1936-1939) o obrigaram a mudar-se para os Estados Unidos, onde passou a lecionar na Universidade Johns Hopkins, em Baltimore. Em 1943, transferiu-se para a Universidade de Porto Rico, mas reassumiu mais tarde a cátedra na Johns Hopkins. Morreu em Boston, mas está sepultado em San Juan de Puerto Rico.

                                                           III

            Quem compulsar o original e ler estes dois livros de Salinas que saíram agora em português vai constatar que o poeta teve a sorte de encontrar o seu tradutor ideal. Salinas não é um poeta rebuscado – pelo contrário, busca a singeleza como ideal –, mas, por isso mesmo, é de difícil tradução, ou seja, é fundamental que seu tradutor seja também poeta, pois, muitas vezes, a singeleza de seus versos exige a recriação.

            Por isso, encontrou em José Jeronymo Rivera um “poeta disfrazado de traductor”, na perfeita definição que consta do estudo introdutório que José Antonio Pérez-Montoro escreveu para A Voz a ti Devida. Em outras palavras: Rivera seria o interlocutor certo não só pelo conhecimento que tem da língua espanhola como pelo respeito que devota à sintaxe original. Vejamos como exemplo estes versos de Razão de Amor:

                                   Serás, amor,

                                   um grande adeus que não se acaba?

                                   Viver, desde o princípio, é separar-se.

                                   Já no primeiro encontro,

                                   com a luz e com os lábios,

                                   o coração percebe essa aflição

                                   de ter que cego estar e só um dia.

                                   Amor é demora milagrosa

                                   de seu próprio acabar:

                                   é prolongar o feito mágico

                                   de que um e um sejam dois, ao contrário

                                   de uma primeira pena desta vida. (…)

 

                                   (…) Se se estreitam as mãos, e se se abraça,

                                   nunca é para afastar-se,

                                   é porque a alma cegamente sente

                                   que a forma permissível de estar juntos

                                   é uma despedida grande, clara.

                                   É que o que é mais seguro é sempre o adeus.

            No estudo introdutório que escreveu para Razão de Amor & Longo Lamento, o poeta Anderson Braga Horta reconhece que a tradução perfeita é impossível, mas observa que, no caso, “a perfeição da tradução está em reproduzir, recompor, recriar em vernáculo um artefato com o máximo das qualidades do original”. É, de fato, o que faz Rivera, “poeta experimentado na arte de traduzir”, segundo a definição de Braga Horta.

                                                           IV                                  

            Engenheiro civil, economista e administrador, Rivera, que reside em Brasília desde 1961, foi professor universitário e de ensino médio. É membro da Academia de Letras do Brasil, da Academia Brasiliense de Letras, da Associação Nacional de Escritores (ANE) e da Academia Leopoldinense de Letras e Artes.

            Leitor compulsivo em espanhol, francês, inglês e italiano, Rivera tem dado uma contribuição inestimável ao enriquecimento das letras nacionais com criações originais de outras línguas, como é bom exemplo a tradução que fez de Gaspard de la Nuit, de Aloysius Bertrand (1807-1841). Produziu também numerosas versões do português para o castelhano, algumas já publicadas emPoetas Portugueses y Brasileños de los Simbolistas a los Modernistas, obra organizada pelo professor José Augusto Seabra (1937-2004), ao tempo em que era embaixador de Portugal em Buenos Aires, publicada pelo Instituto Camões.

            Traduziu também Cidades Tentaculares, poemas do belga Émile Verhaeren (1855-1916), de quem tem pronta para ao prelo a versão de Les Heurs. Traduziu ainda o clássico Rimas, de Gustavo Adolfo Bécquer (1836-1870). De sua produção poética, publicou Aprendizado de poesia: 1951-1953 (Brasília: Thesaurus Editora, 2004). Publicou ainda Humberto de Campos: Poesia;Xavier Placer: Poemas; Miguel Torga: Contos; e Almeida Garrett: Poesias, pela Thesaurus Editora. Colaborou, em parceria, na tradução de Poetas do Século de Ouro Espanhol; Victor Hugo: Dois Séculos de Poesia; Sátiro e Outros Poemas; Antologia Poética Ibero-Americana; e Rodolfo Alonso: Antologia Pessoal, entre outros. É detentor dos prêmios de tradução Joaquim Norberto e Cecília Meireles, da União Brasileira de Escritores (UBE), do Rio de Janeiro.

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Razão de Amor & Longo Lamento, de Pedro Salinas. Tradução de José Jeronymo Rivera, com apresentação de Fabio de Sousa Coutinho e estudo introdutório de Anderson Braga Horta. Goiânia: Editora Kelps, 2016, 224 págs. E-mail: kelps@kelps.com.br

Site: www.kelps.com.br

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(*) Adelto Gonçalves é mestre em Língua Espanhola e Literaturas Espanhola e Hispano-americana e doutor em Literatura Portuguesa pela Universidade de São Paulo (USP) e autor de Os vira-latas da madrugada (Rio de Janeiro, José Olympio Editora, 1981; Taubaté, Letra Selvagem, 2015), Gonzaga, um poeta do Iluminismo (Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1999), Barcelona brasileira (Lisboa, Nova Arrancada, 1999; São Paulo, Publisher Brasil, 2002), Bocage – o perfil perdido (Lisboa, Caminho, 2003), Tomás Antônio Gonzaga(Academia Brasileira de Letras/Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2012), e Direito e Justiça em Terras d´El-Rei na São Paulo Colonial (Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2015), entre outros. E-mail: marilizadelto@uol .com.br

Ninguém | Domingos da Mota

Há-de chegar o dia em que ninguém

se lembrará de ti – e, de passagem,

quase todos depois serão também

esquecidos no meio da voragem

que aprofunda a imensa desmemória

e mesmo que algumas das pegadas

tenham marcas visíveis, nem a história

deverá discernir de que passadas,

de quem era o pé ou o sapato

que deixou por ali aquele indício,

se fugia ou caçava ou se de facto

se lançou ou caiu no precipício

por acaso ou descaso ou livre-arbítrio

ou vítima das hastes do delírio.

 

Domingos da Mota

 

[inédito]

 

(tendo, como pano de fundo, a Ladainha dos Póstumos Natais, de David Mourão-Ferreira)

Uma radiografia da elite senhorial | Adelto Gonçalves

                                                           I

        De onde veio a elite senhorial brasileira? De Portugal, claro. Mas não de Lisboa. Veio, isso sim, em grande parte, do Norte de Portugal e das ilhas açorianas. Na maioria, os fundadores das famílias que constituíram a aristocracia rural, da qual resultaram alguns influentes políticos que ainda hoje se destacam no cenário nacional, chegaram aqui com uma mão na frente e outra atrás, em busca da chamada “árvore das patacas”. À custa de muito esforço, obtiveram sesmarias, escravizaram indígenas e tornaram-se latifundiários, escravocratas e capitalistas, ou seja, “homens bons” no século XVIII. Quase todos seriam pessoas de escassas letras.

            Quem duvida que procure ler o Dicionário Histórico do Vale do Paraíba Fluminense, publicado pelo Instituto Histórico e Geográfico de Vassouras (IHGV) e pela Prefeitura Municipal de Vassouras, com o apoio da Nova Imprensa Oficial do Estado do Rio de Janeiro, organizado pelas historiadoras Irenilda R.B.R.M. Cavalcanti, Neusa Fernandes e Roselene de Cássia Coelho Martins com a colaboração de mais 21 pesquisadores, entre os quais se destacam Antonio Henrique Cunha Bueno e Carlos Eduardo Barata, autores do Dicionário das famílias brasileiras (São Paulo, Editora Ibero-Americana, 1999).

            Quem tiver a sorte de colocar as mãos neste livro vai conhecer um trabalho pioneiro sobre seis municípios fluminenses – Vassouras, Barra do Piraí, Campos dos Goitacazes, Barra Mansa, Resende e Volta Redonda –, que recupera a história de 45 famílias tradicionais, além de reunir informações sobre instituições culturais, políticas, educacionais e religiosas. Constitui ainda importante conjunto patrimonial e histórico da época áurea do café que, no século XIX, marcou os destinos do Vale do Paraíba Fluminense.

            Uma importante família foi a Andrade, que teve início na região com a chegada em 1751 de Cristóvão Rodrigues de Andrade, natural do lugar de Nogueira da Costa na freguesia de São Pedro, bispado do Viseu, que fica no encaixe entre o Centro e o Norte de Portugal. Outra foi a Antunes Moreira, cujo patriarca no Brasil foi Manuel Antunes Aldeia, natural da Aldeia da Ponte, termo da Vila dos Alfaiates, na Guarda.

                                                           II

            Uma família que não se destacou por sua riqueza, mas que ficou bastante conhecida no Brasil foi aquela iniciada por João Augusto Soares Brandão (1844-1921), nascido no povoado de Lomba da Maia, na ilha de São Miguel, nos Açores, aliás, a mesma terra do avô materno deste resenhista, cujo pai era natural do lugar de Peias, freguesia (hoje vila) de Carvalhosa, no concelho de Paços de Ferreira, Norte de Portugal.

            Brandão adquiriu as primeiras letras no Brasil, tendo trabalhado como caixeiro em uma padaria e charuteiro no centro do Rio de Janeiro, antes de seguir a carreira artística, o que se deu depois de assistir a várias peças do grande ator João Caetano (1808-1863). Atuou em companhias mambembes que percorriam as cidades do interior do Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais. Em 1883, passou a morar em Vassouras, apresentando-se no teatro local. Um de seus rebentos foi o célebre ator e comediante Brandão Filho (1910-1998).

            Uma família que se destacou em Vassouras foi a de Benjamin Benatar (1809-1859), que nada tinha de português. Era natural do Gibraltar, Marrocos. Chegou ao Brasil em 1829, instalando-se em Vassouras, em 1838, como dono de botequim, com jogo de bilhar, e venda de secos e molhados. Casou-se em 1841 no Rio de Janeiro com a paulista Brites Maria da Costa Gavião. Foi um dos comerciantes mais prósperos da cidade, mas o episódio que o marcou para sempre foi a opção no leito de morte de morrer como judeu. Por isso, embora fosse participante da Irmandade de Nossa Senhora da Conceição de Vassouras, foi-lhe negada sepultura no único cemitério da cidade.

            Curiosamente, a família de Vassouras mais conhecida também não era totalmente de origem portuguesa: Lacerda Werneck, da aristocracia rural cafeeira, do qual descendia Carlos Frederico Werneck Lacerda (1914-1977), jornalista, fundador do jornal Tribuna da Imprensa e da Editora Nova Fronteira, do Rio de Janeiro, deputado federal e governador do Estado da Guanabara (1960-1965), que teve importante papel na articulação do golpe civil-militar de 1964, até que, mais tarde, decidiu romper com a ditadura (1964-1985). Teve início esta família com Johan Werneck (c.1670-1722), que se declarava de nação alemã, embora haja uma corrente de historiadores que indica esta linhagem como de origem irlandesa.

            Ao contrário do seu filho Carlos, expoente do pensamento conservador, o tribuno e escritor Maurício de Lacerda (1888–1959) destacou-se como advogado defensor de operários anarquistas e comunistas. Era o ex-governador também neto paterno do magistrado Sebastião Gonçalves de Lacerda (1864-1925), ministro do Supremo Tribunal Federal (1912) e ministro da Viação e Obras Públicas no governo de Prudente de Morais (1894-1898). Sua mãe foi Olga Caminhoá Werneck (1892–1979). Embora nascido no Rio de Janeiro, Carlos Lacerda foi registrado em cartório de Vassouras e sempre esteve muito ligado à cidade. Como o pai e os tios Paulo Lacerda e Fernando Paiva de Lacerda, foi comunista até 1939, período em que combateu a ditadura de Getúlio Vargas. Naquele ano, rompeu com o movimento, depois de concluir que aquela doutrina levaria “a uma ditadura pior que as outras, porque muito mais organizada”.

                                                           III

            Uma vassourense ilustre foi Eufrásia Teixeira Leite (1850-1930), mulher avançada para o seu tempo, que viveu sua infância e adolescência numa bela residência senhorial conhecida como a Casa da Hera. Recebeu educação esmerada, apreciava literatura, lia Johann Wolfgang von Goethe (1749-1832) e contos de Edgar Allan Poe (1809-1849).

            Viveu um romance de 14 anos com Joaquim Nabuco (1849-1910), advogado, herdeiro de latifundiário pernambucano e defensor da liberdade para os escravos, grande tribuno e jornalista combativo, que despertava a ira dos conservadores que o consideravam um “arrogante mulato nordestino e perigoso abolicionista”, segundo a historiadora Neusa Fernandes. Aliás, quem quiser conhecer a fundo a história desse romance deve procurar ler o livro Eufrásia e Nabuco (Rio de Janeiro, Mauad, 2012), da historiadora Neusa Fernandes, que teve acesso à longa correspondência trocada entre os amantes.

            O Dicionário também inclui verbetes dedicados ao chefe quilombola Manoel Congo, que teve seu memorial inaugurado em 1996. Manoel Congo, com sua companheira Mariana Crioula, liderou uma rebelião que envolveu mais de 300 escravos em novembro de 1838. Sufocada a rebelião, Manuel Congo foi enforcado em 1839. O memorial, um modesto monumento, hoje pode ser visto no antigo Largo da Forca, localizado no bairro da Pedreira, a 100 metros do centro histórico de Vassouras. Sobre o quilombo de Manoel Congo, Carlos Lacerda publicou em 1935 um livreto assinado sob o pseudônimo Marcos.

            Epifânio Moçambique, outro líder da revolta de escravos ocorrida em 1838, é também recordado em verbete. Coube ao coronel-chefe da Legião da Guarda Nacional, Francisco Peixoto de Lacerda Werneck, também senhor de escravos e proprietário de fazenda de café, organizar a grande força policial que sufocou a revolta.

                                                   IV

        Neusa Fernandes é historiadora, museóloga e pós-doutora em História e Literatura. Professora da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e da UniRio, é sócia efetiva do IHGV e pesquisadora do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), além de autora de dez livros de História e de Museologia, entre os quais A Inquisição em Minas Gerais no século XVIII (Rio de Janeiro, Mauad, 3ª ed., 2014), outra obra imperdível para historiadores e estudantes de História.

            Irenilda Cavalcanti é doutora em História Social pela Universidade Federal Fluminense (UFF), professora adjunta e coordenadora dos cursos de mestrado e graduação em História da Universidade Severino Sombra (USS), de Vassouras. Sócia do IHGV, é autora de capítulo do livro História Urbana: memória, cultura e sociedade, publicado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV).

            Roselene de Cássia Coelho Martins é graduada em História e pós-graduada em História do Brasil pela USS, com mestrado em História Social pela mesma instituição. Sócia-fundadora do IHGV, é consultora e pesquisadora em História na área de Arqueologia (em sítios urbanos e rurais) e Arquitetura de patrimônios tombados.    

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Dicionário Histórico do Vale do Paraíba Fluminense, de Irenilda R.B.R.M. Cavalcanti, Neusa Fernandes e Roselene de Cássia Coelho Martins, com apresentação de Carlos Wehrs, membro emérito do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB). Vassouras-RJ: Instituto Histórico e Geográfico de Vassouras/Prefeitura Municipal de Vassouras/Nova Imprensa Oficial do Estado do Rio de Janeiro, 344 págs., 2016.

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(*) Adelto Gonçalves é doutor em Literatura Portuguesa pela Universidade de São Paulo (USP) e autor de Os vira-latas da madrugada(Rio de Janeiro, José Olympio Editora, 1981; Taubaté, Letra Selvagem, 2015), Gonzaga, um poeta do Iluminismo (Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1999), Barcelona brasileira (Lisboa, Nova Arrancada, 1999; São Paulo, Publisher Brasil, 2002), Bocage – o perfil perdido(Lisboa, Caminho, 2003), Tomás Antônio Gonzaga (Academia Brasileira de Letras/Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2012), eDireito e Justiça em Terras d´El-Rei na São Paulo Colonial (Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2015), entre outros. E-mail: marilizadelto@uol.com.br

A Sangue Frio, de Truman Capote

No ano em que passam 50 anos desde a sua primeira edição, a Dom Quixote reedita esta obra incontornável da história da literatura e que colocou o autor, Truman Capote, entre os maiores escritores da sua geração. Com A Sangue Frio, Capote deu origem ao chamado “romance não-ficção”.

Na madrugada do dia 15 de Novembro de 1959, na pequena cidade de Holcomb, Kansas, quatro membros da família Clutter foram selvaticamente assassinados a tiro de espingarda. Aparentemente não havia nenhum motivo para o crime, e não foram deixadas quase nenhumas pistas. À medida que Capote reconstrói o crime e a investigação que levou à captura, julgamento e execução dos assassinos, vai criando um clima de suspense arrasador e de espantosa empatia.

A Sangue-Frio é uma obra que transcende o seu momento, demonstrando uma profunda compreensão da natureza da violência na América.

Nota de Imprensa da D. Quixote.

A Sangue Frio

Roman Polanski adapta ao cinema «A Partir de Uma História Verdadeira»

O realizador Roman Polanski vai adaptar ao cinema o mais recente romance da escritora francesa — e também realizadora — Delphine de Vigan, A Partir de Uma História Verdadeira, publicado em Portugal pela Quetzal Editores, em maio de 2016. Olivier Assayas será o argumentista e estima-se que o filme chegue às salas de cinema em 2018.

Esta não é a primeira obra de Delphine de Vigan a ser adaptada ao grande ecrã. Obras anteriores como No et Moi ou À Coup Sûr são exemplo disso.

A Partir de Uma História Verdadeira conta a inquietante história – que se suspeita que seja autobiográfica – da luta de uma escritora em começar um novo livro e a relação perigosa que mantém com uma fã obcecada.

“Sim L. entrou na minha vida e perturbou-a profunda, lenta, segura e insidiosamente. L. entrou na minha vida como num palco de teatro, a meio da representação, como se um encenador se tivesse esforçado por esbater tudo à sua volta para lhe dar destaque, como se L. fosse planeada para revelar a sua importância, para que naquele preciso momento o espectador e as outras personagens presentes na cena (eu, neste caso) só tivessem olhos para ela, para que tudo, à nossa volta, ficasse em suspenso, e que a voz dela se ouvisse no fundo da sala, enfim para que ela pudesse sobressair.»

A Partir de Uma História Verdadeira foi galardoado com os prémios Renaudot 2015 e Goncourt des Lycéens 2015 e encontra-se disponível para compra nas livrarias portuguesas bem como online.

Delphine de VeganDelphine de Vigan é escritora e realizadora. Começou a publicar em 2001. Em 2007, o romance No et moi trouxe-lhe notoriedade através do Prémio dos Livreiros, do Prémio dos Rotários e da sua adaptação ao cinema.

Os livros que se seguiram destacam-se pelo sucesso, sobretudo Rien ne s’oppose à la nuit: a par do enorme reconhecimento do público em geral (o livro teve vendas de cerca de um milhão de exemplares), obteve ainda o prémio Fnac, o prémio das leitoras da Elle, o Renaudot des Lycéens e o France Télévisions.

Nota de Imprensa da Editora Quetzal.

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Luz em Agosto, de William Faulkner

Romance de natureza polifónica, Luz em Agosto radicaliza alguns dos procedimentos característicos da prosa de Faulkner para apresentar três histórias, aparentemente distintas, que acabam por se entrelaçar. O tempo da narrativa está sujeito a avanços e recuos, mas essa variação temporal nunca obscurece nem torna hermético o que se conta, servindo antes para acrescentar traços à composição psicológica das personagens e desvendar camadas mais profundas da trama em que são enredadas. No centro da narrativa está Joe Natal, um branco com sangue de negro, consumido pela falta de identidade, que reage com violência contra um mundo que o rejeita desde o seu nascimento.

Igualmente à margem da sociedade, vagueiam criaturas como Lena Grove, uma adolescente órfã que percorre um árduo caminho do Alabama até Jefferson, no Tennessee, em busca do homem que a abandonou grávida.

É num ambiente de fracasso, culpa, preconceito e fanatismo religioso que se debatem as personagens de Luz em Agosto, todas em busca do seu lugar num mundo que lhes reservou apenas um destino trágico.

Nota de Imprensa da D. Quixote.

Luz em Agosto

A Canção de Susannah, de Stephen King

Os fãs da série A Torre Negra, de Stephen King, vão poder continuar a vibrar com as aventuras de Roland Deschain, o protagonista desta saga que é considerada a obra mais visionária do escritor norte-americano. A Canção de Susannah chega às livrarias no dia 22 de julho, sendo o sexto volume desta série de fantasia.

A série já está a ser adaptada ao cinema, com o ator Idris Elba – conhecido pelo seu papel na série de televisão Luther – no papel do pistoleiro Roland Deschain. A Torre Negra é comparada por muitos à trilogia O Senhor dos Anéis devido ao elemento fantasia. Porém, esta série combina ainda motivos western e ficção científica.

«O pistoleiro deixou que ele desse uma última sacudidela para ajeitar o manto negro e começou a fazer a sua pergunta, mas percebeu que não era preciso. Quarenta ou cinquenta metros à frente, do lado direito da estrada, havia um amplo monte de espigas de milho desenraizadas, onde no dia anterior não havia monte nenhum. Era uma pira funerária, percebeu Roland, construída sem qualquer respeito.»

Sinopse:
Na sua viagem em direção à torre, Roland e o seu ka-tet enfrentam adversidades sem fim: Susannah Dean foi levada por um demónio elemental e usa a Treze Negra para ir para Nova Iorque. Mas quem é o pai da criança? E que papel desempenha o Rei Rubro nesta história? Roland envia Jake para tentar desviar Susannah do seu terrível destino, ao passo que ele próprio se dirige ao Maine para conversar com um certo Stephen King, autor de ‘Salem’s Lot: A Hora do Vampiro.
Um livro surpreendente que deixará os leitores desesperados pelo capítulo final desta série…

Sobre o autor:
Stephen King é um dos mais populares autores contemporâneos. Escreveu mais de quarenta livros, incluindo Carrie, A História de Lisey e Cell, Chamada para a Morte. Recebeu diversos prémios literários ao longo da sua carreira, incluindo o Bram Stoker Award, o World Fantasy Award, o Nebula Award e o prestigiado National Book Award. Conta hoje com mais de trezentos milhões de exemplares vendidos em cerca de trinta e cinco países. Números e um currículo impressionantes a fazerem jus ao seu estatuto de escritor mais bem pago do mundo.

Nota de Imprensa da Bertrand Editora.

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Mulherzinhas, de Louisa May Alcott

A Bertrand Editora lança, pela primeira vez, «Mulherzinhas», de Louisa May Alcott. Traduzido por Maria da Graça Moura Brás, este grande clássico da literatura juvenil chega às livrarias portuguesas no próximo dia 22 de julho.

Publicado originalmente em 1868, este livro que se mantém intemporal e que continua a permanecer como uma das leituras preferenciais entre jovens, conta com personagens marcantes e com um enredo distinguido pela união familiar e o amor.

Sinopse:
As irmãs Meg, Jo, Beth e Amy passam por um período difícil depois de verem o pai partir para a guerra e de se confrontarem com problemas económicos inesperados. No entanto, a união familiar e o espírito lutador que conseguem manter juntamente com a mãe ajudam-nas a ultrapassar todas as dificuldades. Quer em casa quer nas relações com os amigos e vizinhos, conseguem surpreender e continuar a ser fiéis aos seus sonhos, vivendo todos os dias com esperança e boa disposição.
Um livro que nos dá o retrato de uma família de classe média americana do seu tempo, sublinhando os seus principais valores morais, e em que o amor e a coragem se revelam mais fortes do que todas as dificuldades.

Sobre a autora:
Louisa May Alcott é uma autora norte-americana que sonhava ser atriz mas que acabou por se tornar uma figura incontornável no panorama da literatura juvenil. Criada com a família na Nova Inglaterra, cresceu rodeada de reconhecidos intelectuais, tais como Nathaniel Hawthorne e Henry David Thoreau, amigos do seu pai, que era filósofo e professor. Além da sua notoriedade como escritora, tornou-se muito popular pelas posições que assumiu em defesa da abolição da escravatura e do direito de voto para as mulheres.

Nota de Imprensa Bertrand Editora.

978-972-25-3163-4_Mulherzinhas

CCB – Lançamento do livro «Segurança Social»

Francisco Louçã, José Luís Albuquerque, Vítor Junqueira e João Ramos de Almeida lançam o livro «A Segurança Social» no próximo dia 26 de julho, às 18h, no Centro Cultural de Belém, contando com Ana Feijão, Assessora Parlamentar do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda; Manuel Carvalho da Silva, Investigador do Centro de Estudos Sociais; e Cláudia Joaquim, Secretária de Estado da Segurança Social, como apresentadores.

Disponível à venda desde 15 de julho, «Segurança Social» nasceu dos trabalhos das Oficinas sobre Políticas Alternativas e conta com o contributo de outros investigadores em políticas sociais, Manuel Pires, Maria Clara Murteira, Nuno Serra e Ricardo Antunes.
Considerando as existentes pressões internacionais sobre o Estado português, e sendo este um dos debates atuais mais intensos, «Segurança Social» responde a esta discussão com base em informação estatística e documentos de referência, apresentando a possibilidade de construção de um sistema sólido de segurança social. Fruto de uma forte investigação sobre as políticas sociais, «Segurança Social» levanta variadas questões sobre regras sociais e sugere respostas, apresentando as diferentes perspetivas dos autores que, em conjunto, procuram responder a uma preocupação comum: a de que os sistemas de proteção social são formas essenciais da democracia.
Lançamento do livro «Segurança Social»
26 de julho, terça-feira, às 18h
Sala Amália Rodrigues, Centro Cultural de Belém
Praça do Império, 1449-003 Lisboa

Convite Seguranca Social

A Gravitação do Amor, de Sara Stridsberg

Este romance, vencedor do Prémio Selma Lagerlöf Literary Award 2016 e do Prémio Literário da União Europeia, conta a história da aproximação de Jackie ao seu pai, Jimmie, quando este é internado num hospital psiquiátrico. Jackie começa a passar cada vez mais tempo na instituição, até ela se tornar o seu mundo.

«Ao fim do dia, saem do hospital. Quando os portões elétricos se afastam para os deixar passar, abrem a primeira garrafa, no banco traseiro, sempre champanhe que ficou a refrescar na cave durante o dia. Edvard atravessa as pontes, a caminho da cidade, e percorre as ruas de bairros de moradias adormecidos. Às vezes há uma rapariga do hospital, outras vezes é Sabina que vai no banco de trás, outras vezes é outra pessoa, frequentemente meio adormecida pelos medicamentos. Os troncos das bétulas brilham no crepúsculo, um céu de tinta com manchas de rosa e dourado, ténues nuvens dispersas, aves, um desenho tosco dos céus. Edvard tem a convicção de que é bom para os pacientes saírem de vez em quando.»

Sinopse:
«Quando Jimmie Darling é admitido no hospital psiquiátrico Beckomberga, nos arredores de Estocolmo, a sua filha Jackie começa a passar cada vez mais tempo na instituição, até que esta se torna todo o seu mundo quando a mãe parte numa viagem de férias.

No hospital conhecemos o médico responsável, Edvard Winterson, que às vezes leva Jimmie e outros doentes a grandes festas na cidade. «Uma noite passada fora do recinto do hospital torna-vos novamente humanos», diz ele.
Conhecemos também Inger Vogel, uma «enfermeira angélica de socas», que parece habitar um mundo entre a ordem e a devastação, bem como a doente Sabina, objeto dos desejos tanto de Jimmie como de Edvard, com as suas contas coloridas e a sua obsessão com a liberdade e a morte.

A Gravitação do Amor, um livro de uma beleza arrasadora, explora o amor de Jackie por Jim e o modo como tenta aproximar-se dele, tanto em criança como em adulta e já mãe, tendo sempre como pano de fundo Beckomberga, na sua dimensão quase mítica de anjo punidor e redentor de espíritos atormentados.»

Sobre a autora:
Nascida em 1972, é uma das mais aclamadas escritoras e dramaturgas suecas, vencedora de diversos prémios e distinções literárias. Em 2016 foi eleita para a Academia Sueca, a entidade que atribui o Prémio Nobel. Vive em Estocolmo.

Nota de Imprensa Bertrand Editores.

A Gravitação do Amor_1

O SILÊNCIO DO MAR, de Yrsa Sigurdardóttir

Um iate de luxo chega à marina de Reiquejavique sem ninguém a bordo. O que aconteceu à tripulação e à família que seguiam nele quando zarpou de Lisboa?

Neste livro, Sigurdardóttir mescla o romance policial – de que a advogada Thora Gudmundsdóttir volta a ser protagonista – com o sobrenatural – já experimentado no seu livro anterior Alguém Para Tomar conta de Mim. O melhor e mais assustador romance que Sigurdardóttir escreveu até hoje.

O_SilencioDoMar

A Quinta Estação, de Mons Kallentoft

No início de maio, Roger Andersson e os filhos estão a apanhar cogumelos na floresta de Östergötland, quando o que deveria ser uma manhã de saudável convívio familiar se transforma num pesadelo: no meio de uma clareira, tropeçam num corpo mutilado e com evidentes sinais de tortura.

A inspetora Malin Fors estabelece de imediato um paralelo com o caso de Maria Murval, a jovem que anos antes fora encontrada na floresta depois de violada e brutalmente agredida, e que, desde então, permanece numa clínica psiquiátrica, muda e fortemente perturbada. Por coincidência, na mesma altura, Malin conhece também uma psiquiatra do Hospital de São Lars, em Lund, que lhe fala de um caso semelhante e, de súbito, Maria Murval parece ser apenas mais uma peça de um enorme puzzle. Mas que MAL é esse que anda à solta nas florestas da Suécia, um MAL tão demoníaco que não se consegue identificar?

 Nota de Imprensa da D. Quixote.

A Quinta Estação

Como um fósforo | Domingos da Mota

Vai de mal a pior este começo:

traçado o azimute, nesse rumo,

não quero estar na pele, pagar o preço

do frio que virá depois do fumo,

pois se fogo sem fumo não existe,

tanto fogo-de-vista, mesmo preso,

faísca como um fósforo que insiste

até que chega o dia em que, surpreso,

se descobre tão-só como um punhado

de cinzas a um canto da lareira­:

há começos assim; outros, assado,

e muitos quando atiçam a fogueira

não cuidam de saber o santo-e-senha

para ter no inverno alguma lenha.

 

Domingos da Mota

[inédito]