Henrique Normando: “A Poesia escapa a formas rígidas e definitivas”

1 – O que é para si a

Literatura ?

H.N. –   Segundo o

conceito tradicional,o Autor é uma pessoa que escreve usando exclusivamente o

poder da sua imaginação. Para Barthes, no mundo moderno,este conceito está

obsoleto, pois segundo ele,o Autor combina” textos pré-existentes em novas

formas.”       Estou em desacordo com o

pensamento de Barthes, talvez porque sou essencialmente um escritor de Poesia e

acredito que um Poeta só é original e “verdadeiro” se inovar, sendo um Criador

que transmite  ao Leitor a essência da sua alma e das suas experiências

envolvendo, ainda que inconscientemente,as influências que recebeu dos autores

que leu,com destaque para os que mais o marcaram.

2 – O que pensa da Poesia que se faz

actualmente em Portugal?

H.N. – Penso que a maior parte  da Poesia que se

publica,é cosmética.Não resisto a citar Alexander  Soljenitsyne, que a

propósito de Literatura, referia : “Uma literatura que não respire o ar da

sociedade que lhe é contemporânea, que não ouse comunicar à sociedade os seus

próprios sofrimentos e as suas próprias aspirações, que não seja capaz de

perceber a tempo os perigos morais e sociais que lhe dizem respeito, não merece

o nome de literatura: quando muito pode aspirar a ser cosmética.”

Conheço no entanto,vários Autores de grande qualidade e originalidade, que não

se limitam a copiar os Mestres e marcam, ou irão marcar através do seu cunho

pessoal, o futuro da nossa literatura.

3 – Acha que um Livro de Poesia deve

ter um fio condutor ?

H.N. – Não acho. Reli há bem

pouco tempo, o livro “Câmara Ardente” de Miguel Torga e não existe lá qualquer

fio condutor, para além da genialidade do Autor em cada poema que escreveu. São

poemas autónomos, tendo o Autor escolhido o título do segundo poema, para dar o

título global ao seu livro. Claro que não tem que ser assim e um livro de

poemas pode ser concebido para ter um fio condutor. Os meus dois últimos livros

publicados, obedecem a uma lógica sequencial. Os dois livros anteriores não

obedecem a essa lógica. O livro que estou a terminar actualmente, tem um fio

condutor .                                                                  A

Poesia escapa a formas rígidas e definitivas.

4 – Como acha que vai ser a Poesia no

Futuro ?

H.N. – Respondo com um excerto

de um poema de António Gedeão, POEMA DO FUTURO, em que este Autor teve o génio

de sintetizar os efeitos do tempo, sobre a forma e o conteúdo da Poesia e da

Literatura em geral, indissociavelmente ligados  à evolução da Humanidade,

em muitos aspectos imprevisível.

Poema do Futuro

……………………………………..

Na História Natural dos sentimentos

tudo se transformou.

O amor tem outras falas,

a dor outras arestas,

a esperança outros disfarces,

a raiva outros esgares.

Estendido sobre a página, exposto e descoberto,

exemplar curioso de um mundo ultrapassado,

é tudo quanto fica,

é tudo quanto resta

de um ser que entre outros seres

vagueou sobre a Terra.

António Gedeão, in ‘Poemas Póstumos’

5 – Acha que a crítica se tem debruçado

sobre os Poetas não consagrados?

H.N. – Acho que não. Penso que

os críticos, salvo raras excepções,encaram os “não consagrados” com algum preconceito

e “ jogam à defesa”. No entanto, reconheço que não é fácil criticar Poesia,

como se torna cada vez mais difícil criticar uma Pintura , uma Escultura,

Fotografia ou Desenho, assim como as instalações interdisciplinares e

respectiva multiplicidade de materiais e suportes utilizados.

                                                        O

mesmo se passa em relação à Música.

                                                              Aliás,

Novalis, poeta romântico( século XVIII / XIX ),dizia que a «crítica da poesia é

um disparate». Segundo ele, “a Poesia não era susceptível de

crítica no sentido até então vigente de crítica explicativa e censurante. Para

Novalis era uma profanação e uma enormidade temerária aferir a poesia por

padrões e submetê-la à jurisdição de cânones, ou defini-la  em

circunscrições lógicas e tradicionalistas.  Poesia não é sequer definível

«Poesie ist indefinissabel “.

6 –    Qual a principal

dificuldade para a divulgação da Poesia?

H.N. – Quanto a mim, o problema

da falta de divulgação reside no afastamento das Escolas e respectivos

programas educacionais, a falta de cultura poética de muitas famílias que

podiam ter um importante papel nesta área do saber, o desinteresse da classe

política pelas questões culturais e as dificuldades de distribuição dos livros

editados.

7-   Acha que há aspectos

positivos, apesar de tudo, relativamente à adesão dos portugueses à Poesia?

H.N. – Acho que sim. Portugal

continua a ser um país com enormes talentos que se vão manifestando gradualmente

e  há várias iniciativas extraordinárias, como as Quintas de Leitura. A

Câmara Clara, na TV 2, também tem sido um importante meio de divulgação

cultural.

                                                                                                                                    Por

outro lado está a criar-se uma nova dinâmica no mundo dos jovens Editores de

grande importância para o futuro da Cultura em Portugal.

8 – Com quatro livros publicados, quis

são os seus projectos para o futuro?

H.N. – Tenciono publicar o meu

quinto livro de poemas ainda este ano. Trata-se

de “O Regresso de Martinez”. Depois

irei acabar um livro de contos que me está a dar muito prazer escrever.

9 – O seu livro recentemente publicado,

O SONHO PERSISTENTE, tem tido a divulgação que esperava?

H.N. – Todas as pessoas que o

leram e me contactaram gostaram muito do livro.No entanto, sei de muitas

pessoas que não o conseguem encontrar nas livrarias onde supostamente ele

estaria. Creio que o Editor está a tentar ultrapassar este problema que se

prende com a distribuição.

10-  Está satisfeito com a

 Edita-Me ?

H.N. – Estou. O Editor é uma

pessoa excepcional em vários sentidos. Dinâmico,multifacetado,inteligente para

além de estar a  ter  um papel muito importante na divulgação

cultural neste país.