Quanto mais idéias queimavam na boca do estranho, mais o calor das pernas da mulher que entrou apenas para pedir fogo ardia. Metia-se em encrenca e não queria. Derretia-se toda e sabia o preço do prazer. Mulher de rua não podia ter sentimentos, este era seu primeiro mandamento. Desrespeitou-o algumas vezes e pagou caro. Não se importava, a noite havia sido carregada de ódios. Arrependimento, nenhum. Não fossem as palavras, o homem ao seu lado não lhe causaria impressão tão boa. Ele tinha algo de madrugada no sangue, os hiatos entre as idéias semelhavam estranhezas que vinham do céu. O convite surgiu quando percebeu que o homem não tinha dinheiro para pagar a cerveja. Vestido em camisa de grife e calças largas de linho, com a cara limpa de crimes, não traria riscos imediatos, disso tinha certeza.
Três luminárias em linho cru, distribuídas de modo a desenhar um triângulo imaginário, desnudaram móveis antigos. Todo o ambiente projetado com equilíbrio e perfeição. O armário envidraçado trazia pratos, jogos de chá e café antigos com motivos rurais em azul. O sofá forrado em seda ocra trazia castelos e jardins medievais. No tapete, a figura de mulheres descansando à beira de um lago.
(continua)