A linha da porta

Com Hashmukh começou por ser a incerteza da vestimenta, a incomodá-lo a diário. Ora não se convencionava com a cor da pele ou com as feições adquiridas no sono, ora distorcia a competente ossatura e lhe abolia altura ora ainda lhe outorgava ares de pouca comida. Hashmukh sabia que não era aquela farpela a salvar-lhe a vontade, mas outra qualquer também não, coisa vulgar de acontecer a uma pessoa nalgum dia, mas não em todos. Depois, arrastou-se a sessão do não conseguir sair do domicílio, da porta escancarada em observação tarde fora, da escada galgada devagar até meio como se acarreasse onze mundos, da chave apertada na concha da mão até quase sangrá-la, sem por certo alcançar a rua, sem aparecer algures noutro quarteirão, noutra ponta da cidade, nem chegar ao posto de trabalho. Fincando-se nos interiores da casa como se fora dela fosse capitular, despia o casacão doses sem conta, desferrava as botas justas uma e outra vez e sentava-se escorreito no hall de saída, que era o maior espaço da casa. Aí, amiúde e sem uma única hesitação, olha  sossegado as próprias mãos, vislumbra-se inteiro nos degraus algo sujos ainda perto de serem usados.

Gabriela Ludovice