A CRIANÇA CAIU EM ALGUM RALO DA RAZÃO – Folhetim em Oito Episódios da autoria de Carlos Pessoa Rosa. – Quinto Episódio

O pontapé na barriga acorda o miserável adormecido no vão do MASP. Não gostou de ser arrancado de sua ilha com único tranco. Homens fardados calaram o ódio. Não vi nada, não sei de nada; costume das madrugadas. Apanhou sem saber motivo. Enquanto se contorcia de dor, os policiais conversavam com a central. O perfume agradável levou seus olhos até o cadáver na calçada. Conhecia o morto, cuidava das mulheres da vida e sempre lhe dava um trocado. Costumava chegar alta madrugada para conferir os negócios. Deixava carro importado na calçada, ao som de Bidonville ou Oblivion. Enquanto meninas aliciavam fregueses, queimava um charuto cubano. Mantinha cabelos escorridos em gel e vestia ternos discretamente listrados. O lenço de seda era acessório inseparável. Cuidava bem das meninas, seria capaz de morrer por elas, mas também tinha seus momentos de histeria que marcavam rostos de vermelho. Não disse nada aos homens da lei. Identificava-se mais com o gigolô.

 

 

 

(continua)