Agora mesmo são 1:11 da manhã e se o planeta explodir, por razões que ninguém conseguirá explicar, estou aqui sozinha. Teria uma importância relativa, uma explosiva imprevista não me permitiria pensar ou sentir qualquer espécie de medo. Se acontecer enquanto durmo, gostei muito deste bocadinho, embora existam algumas coisas que, para ser sincera, podiam ter corrido melhor. Outras são, e serão sempre, maravilhosas, mesmo que o planeta possa explodir daqui a pouco. Dirão: coitada, está deprimida, faz anos. Não estou. Estou agradecida de muito, arrependida de algumas coisas e com decisões tomadas que serão sempre complexas caso o planeta não decida explodir. Não peço que a explosão aconteça, atenção, nada de dramatismos.
A mulher pousou a caneta e achou o gesto bonito. A caneta em cima do tampo de madeira. Há muito tempo que se esquecera da caligrafia, da importância da caligrafia. Há muito tempo escrevera um livro inteiro num caderno pequeno, tamanho A5, capa amarela de tecido… escrevera a duas cores, para distinguir as vozes e, ainda hoje, sabe que o caderno, ou a cópia que guardou, está ali na estante, perto dos poetas. Não está ao lado de outros por uma razão qualquer específica, está ali. Onde o colocou. Este que agora tem à sua frente não é um livro. Ainda não o é. É um pensamento de uma mulher. Depois a caneta, a dormir silenciosa, ditará o resto e a cabeça terá permissão para se esvaziar. A mulher suspira. Não é uma da manhã, são quase quatro. Há um chocolate algures.