Uma mesa. Um bar.

Um homem. Uma mulher.

Um espelho com empregado ao fundo.

A mulher é louca ao espelho: prepara-se para a caçada:

arranha cabelos, mascara cicatrizes, borrifa de perfume os lóbulos; descruza as pernas de renda; os lábios mudam de cor e idade.

A gordura é vício; a fealdade indecisão.

São duas e meia da manhã.

O gelo derrete nos copos.

O homem suspende. Avalia o redor.

A linguagem é imprecisa.

O vazio enche-se de copos.

As almas de vodka.

O homem cansado domestica o bigode;

sossega as sobrancelhas com saliva.

Esquadrinha um novo ângulo numa das patilhas e diz:

-Tenho sono.

A mulher responde:

-Ainda é cedo. Nenhum amor se deita para dormir.

Dentro do espelho, as bocas mordem-se sem sinal de sangue.

O homem levanta-se, sai.

A mulher louca cruza novamente as pernas.

O empregado assiste a tudo, impávido e transparente, enquanto limpa com um pano o bolor dos copos.

Sandro William Junqueira

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