DETALHES… | Ercília Pollice

“… Madalena foi pro mar e eu fiquei a ver navios”…( Chico Buarque)

Valentine está sempre se surpreendendo com o ser humano.

Ela, após a paixão que a flechou há quase dois anos, desistiu de se debater como náufrago em águas fundas , a procura de um lugarzinho que fosse seu e a salvasse de tudo e de todas as aporrinhações dos últimos meses.Nào sabia, ainda, que pra se ter um lugar na vida do outro depende do querer do outro , muito mais do que seu próprio querer. Aprendeu mais uma lição.

Os homens, concluiu Valentine, a valente, não têm a coragem das mulheres.Não assumem riscos, mostram uma confiança que estão londe de sentir, e uma autonomia que não faz parte do seu viver diário.

Podem até ficar encantados com uma mulher, querê-la muito, mas não se arriscam a mudar nada em suas vidas, por mais sem “glamour “, que esta vida esteja.

Todo mundo apregoa aos 4 cantos que a vida deve ser vivida intensamente, que o tempo não perdoa, passa sem pedir passagem, que nossa vida é o agora,que oportunidades não acontecem todo dia, bla , bla, bla..mas na hora do vamos ver, não se muda um centímetro pra vivenciar estas afirmações, moeda corrente em todas as bocas.

Dizem que o trem pega quem anda na linha… O trem pega a gente sempre, na linha ou fora dela, pensa Valentina com seus botões.talvez no amor nunca haja vencedores ou vencidos. Todos perdem, todos ganham de um jeito ou de outro.

Todos sonham com um amor apaixonado, cheio de magia e encantamento,arrebatador, mas poucos são os que se arriscam a vivê-lo.

Valentina viveu mais de um ano de romance on line. Eram, ela e A.J., a corda e a caçamba.

Entendimento , cumplicidade, intimidade, parceria e um tesão a mil, como ele gosta de dizer.

Mas, “ …o anel que tu me deste , era vidro e se quebrou, o amor que tu me tinhas, era pouco e se acabou”…A canção de Aznavour,” She”, embalava os sonhos de ambos. Ele traduziu a canção e lhe mandou. Dizia que se pegava cantarolando ‘She”e que sonhava com Valentina dormindo e acordado.

Em certos aspectos, eles eram tão parecidos. Pareciam ter sido criados pela mesma mãe. Curtiam contar os sonhos da noite anterior, comentavam sobre a vida, filmes, política.Trocavam receitas. Era muita sintonia.Ele nunca deixou de falar da beleza que via nela.

Adoro seus seios, sua boca, suas pernas, sua cabeça.”te adoro”. Ela nunca fez jogo de difícil.Abria seu coração. Mostrava o que sentia, o que queria, o que esperava.

Eram verdadeiros e se falavam tudo. Era uma sedução escancarada. Muitas vezes no meio do trabalho ele pedia pra abrir a cam só pra vê-la por minutos curtos, mas gostosos.E, voltavam ao trabalho.

Tudo neste vida, tem um tempo que é primordial, essencial. Se você nào usa esse “time”na hora certa, a emoção dá lugar à insatisfação. A insatisfação gera discórdia, e a sintonia vai pro ralo.O encanto vira desencanto.

Valentine dança os últimos compassos desse balé, que foi lindo, exuberante, ingênuo e malicioso. Intenso! Tudo a um só tempo. Sabe que foi assim pra ele também. Amaram-se como dois pagãos, falaram palavras doces, ternas, quentes, macias…viveram um amor gostoso diferente, único em certos aspectos, porque era “sui generis”, para ambos.Experiência primeira e única até então, em suas vidas.Também brigaram vezes sem conta, como fazem os amantes de todos os tempos.

Mas, a impossibilidade dele, e o medo de entrar numa roda viva sem saída, afastou-o.

Foi tão sutil este afastamento, que ela nem se deu conta. Quando caiu em si, havia acabado, assim, sem aviso,sem guisos, como na canção… mais um amor frustrado, que não chegou a canto algum, neste mundo cheio de amores desfeitos

.Paixão sem consumação!

Ficou no ar aquele sentimento de perda sem ter sido. De vazio sem ser preenchido. De ver cortada uma experiência plena a ser vivida. Um encontro que foi um presente inesperado a ambos, numa fase da vida onde a emoção já não bate ponto com frequência.

Deixaram passar a chance de viver intensamente uma paixão.Podia nunca ter virado amor, mas, pelo menos saberiam o gosto, o cheiro, o toque. Algo real , não apenas uma fantasia.

Ficou o carinho, a amizade. Passou e encantamento.Ele não percebeu que aquele encantamento era o principal daquele “affair” virtual, até então jamais vivido por ambos. Uma experiência única! Explosiva! Apaixonada! Gostosa! Carregada de sensualidade e sentimento .

Qualquer palavra dita, era entendida como cobrança. Qualquer questionamento virava motivo para ausência calculada. O desgaste veio. Culpa sua, diz o moço.Mas Valentina sabe, que a insegurança gera desconfiança. Indiferença gera desamor.

Nada é eterno.Tudo passa.O importante é ter sido vivido com intereza e complitude.

Tudo isso , nossa amiga Valentina tira de letra.Há tempos ela não se deixa mais sofrer muito tempo por amores desfeitos. Sabe, por experiência vivida e sofrida, que os amores partem sempre, de um jeito ou de outro…

Mas não deixa de se perguntar, como teria sido um encontro real?

Isso nunca saberão. O medo, as impossibilidades, as incertezas foram maiores, que o encontro, que a busca, que as promessas, que o desejo.

Será sempre um sonho inacabado, como são todos os sonhos.

08/01/2011… HISTÓRIAS DE VALENTINA

Ercília Pollice