Viagem para o centro do poder

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O Poder deslumbra, insinua, “ambush”, cativa, demanda, desmanda, vislumbra, domina, escraviza, corrompe, corrói, impele, repele, angaria,  arrecada, consome.

O Poder tem armas: :mata, desnuda, estupra, desfigura, maquia, finge, dita, desdita, embrutece, humilha, dobra.

O poder elimina a sociedade, e  o individuo.Anula o homem, estatela.

O poder reflete inércia, depressão, brutalidade. O mundo gravita em torno do Poder.

O trono do poder refulge, atrai, convida, alucina. Os meios para o poder são todos válidos: a usurpação, a enganação, as trocas, as armação, a religião, a fraqueza humana. O pior é a informação:quanto mais informação, mais poder.A Natureza, esvazia-se de sensibilidade, enche-se de hostilidade.Vinga-se.Transforma-se.O Poder é passageiro,O tempo do Poder não é o nosso tempo.É o tempo dos deuses.O Poder é o brinquedo dos deuses.Até que eles se cansem e transforme o Poder em Decadência.Essa substituta do Poder é a razão e a conseqüência dos poderosos. E chega-se a uma verdade: toda ação tem uma reação contrária. A reação é o Caos.

Porém, àquele estadista nada disso importava, ou achava que com ele  jamais   aconteceria, afinal estava pensando no Povo, ignorando, ou querendo ignorar, que o Povo é a mola propulsora do Poder, é pelo Povo que os heróis se arriscam, se sobrepujam, é com  o aval dele, que se enfrentam.

Em se expondo, se infiltrando, trazendo para si a atenção do mundo, proclamando que sua única intenção era salvaguardar a cidadania de uma população sofrida e esquecida pela humanidade, apoiado pelos órgãos da paz mundial que talvez com a melhor das intenções buscavam um líder para seus propósitos  ou uma justificativa para sua existência.

Sua figura tornou-se conhecida da população, todos admiravam aquele homem desprendido, belo como um deus que largava o conforto de seu lar, a vida cômoda que conseguira, para dedicar-se à pessoas desconhecidas, do país desconhecido  apenas lembrado como um depósito de miseráveis.

Na verdade  o Estadista percebia a manipulação de sua mente agindo sub-repticiamente,   muito menos desconfiava que seguia a máxima antiga de “quem em terra de cegos quem tem um olho é rei”. Não, ele  não se aproveitaria do Poder se o conquistasse. Pensava nas crianças abandonadas pelas ruas das cidades, órfãos da guerra sem sentido, que explodira naquela minúscula nação que morria de fome.Muitos lutavam  ali  pelo Poder de ditar as regras de como distribuir felicidade na terra de ninguém.

Impulsionado pela febre que acomete o corpo, pela excitação e pela ambição, inspirado pelas leituras shakespeareanas, pelas aventuras épicas de heróis medievais, julgou-se um novo salvador. E assim arregaçou as mangas. Escolheu adeptos, nacionalizou empresas estrangeiras, construiu centros médicos, oficializou o ensino e a saúde. O Povo não questionava porque aquele homem que passaram a chamar de protetor  lutava por ele,  e não pelos carentes de seu país  tão necessitados quanto ele. Ele possuía a resposta: solidariedade entre irmãos da mesma raça.

O Povo entusiasmado pela expectativa de uma vida melhor, aclamava e aplaudia.Contra a massa não há resistência. Principalmente a massa sofrida e espoliada. O tempo ajudava. Tudo  muito rápido.

Instala-se o novo Poder. Exalta-se o herói. As riquezas do pais, baseia-se na produção de alimentos  e nas pedras preciosas que proliferam nos veios das montanhas.Em nome do Estado todo o extrativismo permanece no país.

O mundo exterior exige eleições. Querem o Poder da democracia. O Poder da economia baseada no valor faccioso do dinheiro. Na importação e exportação. A resistência provoca invasões e proclama direitos. A necessidade da guerra para a paz exige resposta.

O Poder enfraquece.O Povo exige direitos. O estadista está só. A solidão do Poder instala-se e o herói pede o momento certo de dizer não. O país está à beira do Caos.

Novo salvador, novas regras.O Povo tem novas esperanças. Novas valises.Novas viagens.

Nilza Amaral

Escritora e ficcionista – Brasil