da estranheza do corpo e das ideias

O homem pensou que se resolveria no trânsito, quer dizer, que as ideias ficariam alinhadas e quando chegasse a casa, por fim, teria uma ideia concreta sobre o que fazer. Era sexta-feira. Os carros em fila na auto-estrada mostravam coisas distintas: mulheres a retocar o baton, utivos ao telefone, casais em silêncio, casais a discutir, miúdos chateados no banco detrás, amarrados a cintos com bonecos.

O homem ponderou no seu corpo, na atitude que assumia perante os outros, no dia-a-dia, todos os dias. Sentiu-se estranho e não conseguiu concluir nada. O corpo não lhe permitia muito mais do que avançar, automático, pé no acelerador, pé na embraiagem, travar. A cabeça? Vivia a vida dos outros.

É sempre mais fácil viver a vida dos outros.

Patrícia Reis

Patrícia Reis

Share
Published by
Patrícia Reis

Recent Posts

Gonçalo M. Tavares vence Prémio Literário Vergílio Ferreira 2018

Gonçalo M. Tavares venceu o Prémio Literário Vergílio Ferreira devido à "originalidade da sua obra…

7 anos ago

Gente Lusitana | Paulo Fonseca

Cornucópia rosada de carne palpitante… com neurónios, comandada puro arbítrio, caminhante… Permeável, errante… de louca,…

7 anos ago

Marcos Barrero, poeta de coração paulistano | Adelto Gonçalves

I A exemplo do que Carlos Drummond de Andrade (1902-1987) disse do poeta argentino Rodolfo…

7 anos ago

Em homenagem a Cassiano Nunes | Adelto Gonçalves

                                                    I         Primeiro de uma série de cinco volumes, Poesia - Obra Reunida (Brasília: Universidade de Brasília/Thesaurus Editora,…

7 anos ago

Desvão de Almas, Miicrocontos, Editora Penalux, SP | Silas Corrêa Leite

O professor Silas Corrêa Leite, jornalista comunitário, conselheiro diplomado em direitos humanos, ciberpoeta e blogueiro…

7 anos ago