Estio à beira-frio | Maria Isabel Fidalgo

Sinto no frio da chuva
e no frémito do vento
o inverno chegado.
Um certo desalento
um certo desagrado
e uma paixão ao mesmo tempo.
É esta a hora
do crepitar da brasa
e do silêncio recolhido
no calor do livro.
É tempo de carpir
a árvore o corpo desnudado.
Mas se é despida a fêmea vegetal
cobre-se de folhagem
o chão
e a gélida paisagem
esquenta a emoção.
O vento geme nos beirais
e dos confins do céu
não há sinais de asas.
A chuva é cântaro
mas crepita o lume
e a mão espevita
lascivamente o livro.
A página levanta a saia
num sorriso de catraia
e faz-se estio à beira-frio.

Maria Isabel Fidalgo

Das Letras

Share
Published by
Das Letras

Recent Posts

Gonçalo M. Tavares vence Prémio Literário Vergílio Ferreira 2018

Gonçalo M. Tavares venceu o Prémio Literário Vergílio Ferreira devido à "originalidade da sua obra…

7 anos ago

Gente Lusitana | Paulo Fonseca

Cornucópia rosada de carne palpitante… com neurónios, comandada puro arbítrio, caminhante… Permeável, errante… de louca,…

7 anos ago

Marcos Barrero, poeta de coração paulistano | Adelto Gonçalves

I A exemplo do que Carlos Drummond de Andrade (1902-1987) disse do poeta argentino Rodolfo…

7 anos ago

Em homenagem a Cassiano Nunes | Adelto Gonçalves

                                                    I         Primeiro de uma série de cinco volumes, Poesia - Obra Reunida (Brasília: Universidade de Brasília/Thesaurus Editora,…

7 anos ago

Desvão de Almas, Miicrocontos, Editora Penalux, SP | Silas Corrêa Leite

O professor Silas Corrêa Leite, jornalista comunitário, conselheiro diplomado em direitos humanos, ciberpoeta e blogueiro…

7 anos ago