Em festivas cantigas de sol | Lídia Borges

 

 

por vezes percorro jardins de calcário

e sinto pena ao ver

as estátuas de pedra perecer

sem um gesto de libertação.

 

mas aquele menino talhado na rocha, não!

farto de urinar para a fonte abandonada,

numa certa madrugada, sem que se visse

que bicho lhe mordeu, no meio do nevoeiro,

desapareceu.

 

dizem que foi obra de um pássaro azul

que lhe meteu na cabeça asas

e lhe encheu de utopias o coração.

 

por vezes escrevo jardins de calcário

com céus de nuvens

e folhas de ulmeiro pelo chão.

por vezes, entre os canteiros,

passa lesto um menino nu

com um pássaro azul empoleirado

no oiro anelado de um caracol.

 

vão entretidos os dois

em festivas cantigas de sol

e conversas amenas

desentranhando das pedras

os mais estranhos poemas.

 

Lídia Borges