A LUA | Licínia Quitério

 

 

Nestes dias solares,
desassombrados,
em que um sopro nos toca,
dissimuladamente,
e se serve de nós
e nos penetra sem pedir licença
e nos põe a vibrar
como um velho instrumento
esquecido de soar,
queria ser um lagarto
imóvel, esverdeado,
determinado a enganar a vida,
filá-la, distraída,
escondida
em ternuras de pomba
e ganas de falcão,
saltar,
morder-lhe a mão,
nela deixar os dentes
como quem espeta no Sol
um ferro em brasa.
Poder, enfim, esperar solenemente
a Lua,
Senhora das Frescuras e
cavalgar ribeiros e remansos.

Licínia Quitério, em “Da Memória dos Sentidos”, 2005, edição de autor

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