Há uma estranha tendência – pelo menos é o que me parece – em torno dos prémios literários em Portugal. É verdade que somos um país pequeno, mas os prémios parecem uma pescadinha de rabo na boca. O júri, do qual faz parte Vasco Graça Moura, atribui o prémio a Luísa Costa Gomes. O júri, do qual faz parte Luísa Costa Gomes, atribui o prémio a Vasco Graça Moura. Os dois, fazendo parte de um júri, atribuem o prémio a António Lobo Antunes… que, verdade seja dita, ao menos nunca faz parte de júri nenhum.
Quanto à tradução, que todos os anos faz chegar às livrarias a esmagadora maioria das obras, o falido prémio do PEN Clube era entregue – e talvez continue a ser, não sei – mas o envelope ia vazio, era um prémio só para o currículo, mas não para a carteira. Claro que, como todos sabem e eu já aqui repeti vezes sem conta, os tradutores não comem.
Em boa hora, contudo, a Casa da América Latina decidiu premiar a tradução de obras oriundas da região e, neste caso, com dinheiro dentro do envelope: sete mil e quinhentos euros.
Se aquando da publicação de 2666 de Roberto Bolaño logo defendi que Artur Guerra e Cristina Rodriguez mereciam um prémio de tradução, imaginem qual não foi a minha alegria ao vê-los efectivamente recompensados pelo seu fantástico trabalho pela Casa da América Latina. A mestria de uma tradução feita a quatro mãos e quatro olhos, mas apenas a uma voz, e o labor que representa a tradução de uma obra daquela dimensão, ela própria com diferentes registos, perfeitamente entrecruzados, mereciam ser reconhecidos e foram-no de facto.
Refira-se o facto de a Quetzal ter confiado a Artur Guerra e Cristina Rodriguez a tradução de toda a obra de Bolaño, pelo que, se houvesse um prémio para a materialização de um escritor nos seus tradutores, eles seriam sem dúvida contemplados.
Peço desculpa, mas tenho de fazer uma ressalva: Vasco Graça Moura faz parte do júri, mas isso para o caso não interessa.
Maria do Carmo Figueira
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