Num livro, uma frase – uma ferida. Contaminada. Um vírus, à espreita, para se espalhar. Sem uma ferida, que se propaga, não há frase, não há livro. Sem uma ferida, não há leitor. Num leitor, em algum lugar impalpável, uma ferida, mas não a frase contaminada. A diferença do livro: espalhar, não a ferida – que esta, sem ela, não há leitor –, mas, além de cutucar, de dentro, a ferida, espalhar o vírus, na outra ferida, até então imunizada. A frase, o livro – uma contaminação. O leitor, ferida viva, tenta – esparadrapá-la. Consegue: esparadrapa a frase. Não o vírus. Que o invade. Um outro leitor, desse livro, página contra o sol, descobre a frase: Pedir? Como é que se pede? E o que se pede? Pede-se vida. E vejo, então, o que já me contaminara.

Alberto Pucheu

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