Creio que, nos últimos tempos, tenho beneficiado um pouco enquanto editor da putativa falta de espaço para reportagem – ou para alguma profundidade narrativa, digamos assim – no nosso jornalismo impresso.

Desconfio sempre dessas generalizações sobre o jornalismo porque, normalmente, são proferidas por quem desconhece em absoluto o funcionamento da imprensa, as suas limitações e os desafios que lhe são colocados para ir ao encontro daquilo que os leitores pedem. O desconhecimento não torna as críticas menos legítimas, apenas menos consequentes. É um pouco como protestar contra a falta de dinheiro em Portugal. Não serve de grande coisa.

Eu, que sempre me considerei um repórter, mesmo quando passei muito mais tempo dentro de uma redacção a distribuir instruções a jornalistas do que na rua a recolher histórias, sou insuspeito para falar do assunto – mas não verto uma lágrima. Há menos reportagem nos nossos jornais e revistas? Provavelmente, sim. Mas isso não significa que, nas redacções, tenha desaparecido a vontade de sair para a rua, investigar, recolher testemunhos, registar ambientes e contar histórias fora da agenda. Até porque muitos jornalistas – novos e velhos – não concebem a profissão de outra forma. E, para esses, os livros podem ser uma boa saída.

Por isso, até ao Verão, irei publicar uma obra do jornalista Ricardo Marques (Expresso) capaz de tranquilizar quem teme pela morte dos repórteres – e da reportagem com profundidade e substância. Trata-se de uma reconstituição minuciosa de uma parte da nossa história que continua na mais completa obscuridade: as campanhas portuguesas no Norte de Moçambique durante a Primeira Guerra Mundial. O tema foi explorado por João Paulo Borges Coelho no romance O Olho de Hertzog (Prémio LeYa 2009), mas praticamente ignorado pela não-ficção portuguesa.

Os Fantasmas do Rovuma tem todos os ingredientes para ser um sucesso editorial, desde logo a tensão dramática de uma guerra travada no coração das trevas pelos nossos antepassados. Resta saber o mais importante: se o público concorda comigo.

Francisco Camacho

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