E se de repente os insectos, literalmente, agigantassem? Se todos os cães e gatos passassem a ser lobos do tamanho de arranha céus? E se todos os porcos e cavalos e vacas e galinhas e perus aumentassem de tamanho sem escrúpulos? E se todos os aquáticos fossem tubarões famintos; e se todas as aves sofressem uma metamorfose para abutres sedentos de vida? E se todos estes e outros animais nos igualassem em inteligência e comunicação? E se todos eles ansiassem mortandade como nós? O que iriam, muitos de nós, assassinos, comer?…e vestir?
Nós, psicopatas, não precisamos de matar para comer, contudo é isso que fazemos. Todos os dias comemos um bocado de um porquinho ou degustamos uma coxinha de um peru ou uma fatia ou duas do lombinho de um boi ou vaca. Porquê? Ornamentamos o prato com pedaços de animais mortos por nós. Porquê? Tudo o que se desenvolveu, tudo o que conquistamos intelectualmente espelha-nos que o desrespeito e a insensibilidade são o nosso sobrenome. Não cuidamos do outro, seja ele qual for.
Ainda há quem ostente crocodilos no ombro para guardar porta moedas pele de vaca e meia dúzia de papéis substituíveis. Ainda há quem calçe, sob a carne dos seus pés, a pele de cobras outrora vivas. Nós, os doentes, aquecemo-nos, nas noites frias, com penas de sei lá quê!!?! Nós, os tais, esfregamos na face o elixir da juventude com os restos dos assassinados todas as noites e todas as manhãs.
Ainda há gente que se passeia pelos jardins zoológicos – autênticos jazigos de animais vivos, com os filhos a comer cachorros quentes enquanto deleitam agradavelmente as grades que formam a jaula do tigre ou do macaco ou do puma que está preso. Ainda há gente que semeia o sangue dos filhos através de uma ida ao circo com “as mais perigosas piranhas do mundo” ou “os melhores cães futebolistaa do universo”.
O pior é que ainda há gente que diz, num encolher de ombros, que os animais têm de ser…comidos para que se viva com saúde. Há gente que, sem remorso, não procurando justificar o injustificável, afirma que só consegue usar sapatos ou outras dessas coisas mínimas se forem de pele disto ou daquilo. Há gente que declara que se não os aniquilassemos como temos aniquilado, eles andariam por aí e seriam aos montes. Ainda há gente que acredita que eles nao sentem como nós. Há gente, pessoas iguais a mim, que desculpam a existência dos zoológicos ou dos circos com animais ou as touradas com razões de tradição ou com a habituação por fazerem parte do nosso quotidiano. Ainda há gente que não se envergonha, gente que adormece com facilidade mas com as mãos sujas de sangue. Eu tenho vergonha.
Que o próximo predador tenha piedade.
Rui Sobral
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